A Filosofia consiste num cego fechado num quarto escuro e à procura de um gato preto que não está lá.
Quando um filósofo completa uma resposta, ninguém se lembra de qual foi a pergunta. (André Gide)
Na história humana, não há registo de um filósofo feliz. (H.L. Mencken)
Ó Física, poupa-me da Metafísica! (Isaac Newton)
O truque da filosofia é começar por algo tão simples que ninguém ache digno de nota terminar com algo tão complexo que ninguém entenda. (Bertrand Russel)
Quando aquele que ouve não sabe o que aquele que fala quer dizer, e quando aquele que fala também não sabe o que quer dizer: a isto se chama Filosofia. (Voltaire)
Heidegger. A sua "Introdução à Metafísica" esclarece a ideia de que é fácil provar que com a Filosofia se não faz nada. Insiste em que tentar provar o contrário é prestar mau serviço à Filosofia. E aceita peremptoriamente que com a Filosofia não podemos fazer nada; mas, invertendo o critério utilitário que preside à concepção tecnocrática, pergunta: não será antes a Filosofia que faz alguma coisa de/por nós?
Ortega y Gasset, filósofo espanhol com efe grande, escreveu (em Origen y epílogo de la Filosofía) que "A história da Filosofia tem, e não há por quê nem para quê ocultar o facto, um divertido aspecto de doce manicómio (...), [com] traços muito semelhantes à demência".
os filósofos são homens. Mortais, como os gregos gostavam de dizer. Talvez distintos dos (de alguns) demais por uma maluqueira de todo o tamanho. Alguns, pelo menos.
Diz quem sabe que Kant(1724 - 1804) era tão pontual, fazia tudo tão à mesmíssima hora, que os seus contemporâneos acertavam por ele os relógios. Nietzsche(1844 - 1900) era suficientemente atrevidote para achar que as perturbações do Mundo tinham origem no facto de haver cristãos a mais e selvagens a menos.Os deuses encarregar-se-iam do fim do filósofo que lhes vaticinara a morte -- e Nietzsche morreu numa clínica psiquiátrica alemã.
Mesmo entre os filósofos que não (a)parecem tão "anormais" há os que desenvolvem ideias que não lembrariam nem ao diabo... pelo menos até lembrarem a alguém! É o caso do filósofo espanhol Julián Marías, que faz filosofia em torno do conceito de... chupar! Se não acredita, faça favor de ler o verbete respectivo no Lexicon.
Mais dois exemplos a juntar àqueles com os quais se pretende demonstrar a ideia de que os filósofos são loucos:
Eu, que gosto (muito) de Nietzsche, coro quando leio algumas das suas sentenças acerca das mulheres. Disfarço tossindo e sigo... Mas há outros filósofos, por quem nutro menor simpatia, que me irritam mais. Acho que é muito pouco tudo quanto se possa escrever em louvor das mulheres -- e depois aparece-me Schopenhauer(1788-1860) a não compreender como é que algum homem pode "dar o nome de belo sexo a essa raça de tamanho menor que o normal, de ombros estreitos, ancas largas e pernas curtas chamada mulher". Quantas (e quais) mulheres terá conhecido o Sr. Schopenhauer?
Os filósofos são um tanto imprevisíveis (todo o ser humano é, não é?). Tanto no que dizem como no que fazem. Dependerá de para onde lhes puxar a maluqueira. Descartes(1596-1650), por exemplo, decidiu um belo dia pôr tudo em dúvida. A si próprio também -- veja-se só! Se não acredita, leia o seu Discurso do Método, onde se explicam as razões e se diz expressamente: "resolvi supor que todas as coisas que até então tinham entrado no meu espírito não eram mais verdadeiras do que as ilusões dos meus sonhos". Noutra obra (Princípios da Filosofia) fica ainda mais "passado" e ousa mesmo dizer que todos deveríamos fazer o mesmo. Aqui entre nós: e se o filósofo francês tem razão?...
Mas... a loucura não ataca só os filósofos. Há poetas que também não escapam. Veja, por ex., a página As mãos de Deus onde poemas de Antero de Quental, Unamuno e Manuel Alegre nos levam à questão: Deus é maneta ou canhoto?
Santo Agostinho (354-430) é um dos meus filósofos preferidos. (Não deixa de ser curioso que também goste muito de Sartre (1905-1980): afinal, uma das posições fundamentais da filosofia de Sartre é o ateísmo — e Santo Agostinho foi… santo). O que mais me atrai no autor das "Confissões" é a paixão com que viveu a vida: paixão jovem pelas mulheres, pelos copos, pelo jogo — paixão adulta pelo cristianismo.
Um homem que se tornou santo, "apesar da sua pródiga vida sexual e da sua famosa oração a Deus ('faz-me casto — mas não já')". (Jim Hankinson - O especialista instantâneo em Filosofia, Público/Gradiva, p. 19).
O especialista instantâneo em Filosofia é um livrinho que diz coisas sérias de um modo seriamente brincalhão. Desidério Murcho, da Sociedade Portuguesa de Filosofia, traduziu e adaptou. Digo eu que adaptou bem. Só um (outro) exemplo, ainda a propósito de Santo Agostinho: [o santo] "desenvolveu uma teoria do tempo, segundo a qual Deus está fora da corrente temporal de acontecimentos (sendo eterno e imutável, não tinha outra saída), o que quer dizer que o Todo-Poderoso nunca sabe que horas são, mais ou menos como os maquinistas da CP".
Zenão (490-430 a. C.) foi um filósofo (grego) castiço, sobretudo por ter tentado demonstrar uma teoria que nenhum vulgar mortal aceita sem torcer o nariz (e mesmo depois de o torcer): que nada se pode mover e que, se para os olhos o movimento é certeza inegável, teremos que concluir que os olhos nos enganam. A argumentação do filósofo pode resumir-se assim: "Mover-se significa percorrer um determinado espaço. Simplesmente, este é divisível em infinito número de partes e chegar ao fim do percurso significa ter percorrido, um após outro, um número infinito de espaços parciais, o que não é possível num tempo finito." (Fritz Heineman - A Filosofia no século XX, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2ª ed., 1979, p. 75).
Zenão ilustra este argumento com uma história cujos personagens são o conhecido guerreiro grego Aquiles e uma tartaruga. "O veloz Aquiles faz uma corrida com a tartaruga, dando-lhe uma vantagem de dez passos. Apesar disso não consegue alcançá-la. Enquanto percorre os dez passos venceu a tartaruga apenas a distância de um passo. Aquiles deve de novo alcançá-la, mas já ela percorreu 1/10 de passo e, desse modo, torna-se, indubitavelmente, cada vez mais pequena a distância que os separa, embora nunca se anule" (ob. cit.)
Ou seja: sendo o movimento impossível, Aquiles nem sequer sairia do ponto de partida. Corre como verdadeiro o comentário de um professor de Coimbra: "Ai não sai?! Pois substituam a tartaruga por uma dúzia de gajas boas, a ver se ele sai ou não sai!"
Apesar das saídas machistas do homem, por mim está perdoado, pois os pensamentos dos autores estão condicionados à época e às circunstânciasem que vivem (acho eu)
Mas o livro chama-se A Arte de Viver e está publicado em Portugal pela Rés-Editora.
O livro não nos dá fórmulas mágicas e instantâneas para ser feliz mas isso também não seria a pretensão do autor, é daqueles livros que nos acompanha nos momentos em que nos apetece estar sós.
Uma das ideias que mais me marcou: Evita a dor a todo o custo, não procures freneticamente os prazeres porque a dor é real e tu podes bem senti-la mas os prazeres são ilusórios, passageiros...
Boa, boa, gosto de te ver a divagar. Bostazinhas-de-pescada. Mas sabes, isto das percepções nem sempre é igual para todos. Essa por acaso nem foi das que me marcou mais, porque já o sabia dos velhos falares que andam na boca do povo simples; aquele que diz "as más lembranças apagam sempre as boas" - ou coisa do género.
A Arte de Viver (lá cometi borregada nas citações novamente, um troca-tintas eu sou). Assim é que está bem. Obrigado GoodMood!
Olha, marcou bué, nessa livrito de que falas, foi a descrição mecânica que ele faz de vários aspectos da vida em sociedade. É que conhecendo a máquina, pode-se sempre ir fazendo por a tornar mais afinadita.
Lembro-me das descrições que ele faz da história dos homens e da sua relação com a Honra. Um autêntico retrecesso evolucional, quando comparado com há dois mil anos...
E vê lá se te desloggas quando usas o PC que a gente cá sabe, senão eu chego aqui no dia a seguir e deixo as bostas-de-pescada assassinadas em teu nome.
Errrr. Fui eu, fui eu... (outra vez!...)
-- Edited by king_samsa aka jigoku at 22:14, 2005-08-26
Ok Samsa vou ver se tenho mais cuidado ao utilizar "aquele PC que a gente cá sabe".
Mas falando de filósofos também gosto de J.J. Rousseau. Um iluminista puro.
Gosto do Discurso sobre as Origens e Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. É uma viagem às raízes da desigualdade, isto porque o Homem passou a ter necessidades de riqueza e de possuír bens materiais em abundância. Ora sabemos que em tudo na vida resume-se a um "jogo de soma zero" - os ganhos de uns só são possíveis à custa das perdas da maioria - e assim vai aumentando o fosso entre os que têm e os que não têm.
Rousseau defende a tese do "bom selvagem", ou seja, antes do Homem assinar um contrato com a sociedade e fazer um pacto de sujeição para com o Estado (de modo a viver civilizadamente), era um Homem bom, selvagem mas bom, depois disso devido às vicissitudes de ter de viver em harmonia com outros teve necessidade de criar Leis e mais Leis. Ao quebrar essas leis o Homem passa a ser visto como um ser mau por natureza que não pode passar sem quebrar as regras de conduta, as convenções, a ordem social...
Não sei até que ponto isto pode ser certo mas que a ganância pode transportar consigo muitos males, isso acredito...
Pensar que nos idos de 30 há um gajo que pensa os "Grupos Bokanovski" antecipanto a engenharia genética na área da clonagem e dissertando sobre os perigos desta na concepção de castas sociais (desgraçados dos epsilons), o controle mental pelo "soma" e pela religião, a "reserva dos selvagens", a mãe, ou o conceito acerca desta... tudo isto num livro de ficção científica (pois é disso que se trata) em que o aparelho de locomoção mais vanguardista que existe é o helicóptero...
Fantástico.
O selvagem ficou-me cá dentro para sempre, desde os meus 15 aninhos.
Nessa linha fantásticos são também o 1984 e o Fahrenheit 451, ambos objecto de excelentes adaptações cinematográficas.
Do Admirável Mundo Novo existe alguma adaptação ao écran?
Do Admirável Mundo Novo existe alguma adaptação ao écran?
Not that I know of... Mas bem que gostaria. Já li, reli e reli. E concerteza vou voltar a re-ler, tal como a Utopia do Moore...
Mas anda aí um filme, mistura de 1984, com Brave New World, com Matrix, que havias de gostar, pelo menos um pouco (quanto mais não seja, apenas pelo exercício de andar a deslindar o que é inspiração de que obra); procura por Equilibrium.
E a adaptação do 1984, de 1984, já viste? Não é daquele de 1954, do qual tinhas as fotos no "as palavras por dentro", é o outro, mais recente. Comprei este fds na FNAC por 7.95€, nunca pensei que estivesse tão bom. Sugiro a todos que comprem também, já que não é muito fácil de arranjar.
É uma referência de reverência. (gosto mesmo deste trocadalho!)
O Tao não tem nome. Embora o seu cerne seja minúsculo, o mundo inteiro não ousa subjuga-lo.
Se os príncipes e os senhores pudessem aderir ao Tao,todos os seres do mundo se submetiam a eles.
O Céu e a Terra unir-se-iam para que caisse um doce orvalho, os povos sem que ninguem os oprimisse, pacificar-se-iam por si próprios.
Quem funda uma instituição, estabelece diversas funções.Uma vez as funções estabelecidas, é preciso deter a sua multiplicação.Quem sabe deter a tempo esta multiplicação, pode conjurar todas as catástrofes.
O Tao é para o Universo o que os regatos e os vales são para o rio e para o mar.